Um pacto entre duas das maiores produtoras de minério de ferro do mundo promete intensificar a concorrência entre as quatro principais participantes do setor, justamente em um momento de projeção de desaceleração da demanda chinesa após a produção de aço do país atingir o pico.
O acordo entre a brasileira Vale, a maior fornecedora do mundo, e a Fortescue Metals Group, a quarta maior exportadora, inclui planos para desenvolver joint ventures para criar cerca de 80 milhões a 100 milhões de toneladas por ano de um produto misturado que concorreria mais de perto por clientes com as ofertas da BHP Billiton e da Rio Tinto Group.
Isso permitirá à parceria Vale-Fortescue fundir o produto de classificação mais elevada da empresa brasileira com o minério de ferro de qualidade inferior da Fortescue para atender o padrão de referência que tem maior demanda na China.
A Vale disse em dezembro que projeta uma produção de minério de ferro em 2016 de 340 milhões a 350 milhões de toneladas, enquanto a Fortescue espera manter as exportações a uma taxa anual de cerca de 165 milhões de toneladas.
O acordo vai “mais para o lado agressivo que para o lado defensivo”, disse Cauê Araújo, consultor principal da SRK Consulting em Sidney, por telefone. A mistura dos dois minérios teria como foco um segmento do mercado no qual os preços tem sido mais robustos, disse ele.
“É uma estratégia que permite a eles ganhar mais dinheiro no espaço da qualidade média. Isso realmente muda o jogo e nós precisaremos repensar o setor de minério de ferro”.
Queda dos preços
Com a queda de cerca de 67 por cento dos preços desde o pico de 2011, as quatro grandes produtoras focaram no aumento das exportações de baixo custo da Austrália e do Brasil para a China, empurrando as concorrentes menores e de produção mais cara de países como Suécia e Irã para fora do mercado transoceânico.
O quarteto responderá por cerca de 77 por cento da oferta internacional neste ano, por isso o acordo poderá sofrer intervenção antimonopolista da China, segundo a Jefferies.
“Minha visão mais forte seria de que esse acordo poderia permitir que eles controlassem melhor os preços”, disse Gordon Johnson, analista da Axiom Capital Management em Nova York, por telefone. “A segunda reação seria relacionada à Fortescue. Eles estão fazendo isso porque veem a necessidade de caixa mais adiante”.
A Fortescue manteve algumas negociações iniciais com órgãos reguladores e não prevê complicações em termos de concorrência, disse o CEO Nev Power a repórteres na terça-feira em uma teleconferência. O pacto não é visto como um prelúdio de uma aquisição da Fortescue pela Vale, disse ele.
Aquisição de participação
Pelo acordo, a Vale assumiria uma participação de 5 por cento a 15 por cento da Fortescue. Não foi estabelecido um cronograma para a aquisição e a compra ficaria a critério da Vale, disse Power à Bloomberg Television nesta terça-feira em entrevista. As duas empresas poderiam cooperar também em desenvolvimentos futuros de novas minas, disse ele.
A BHP não vê o acordo como “algo que esperaríamos que nos impactasse diretamente”, disse o presidente de operações e da divisão australiana de minerais da produtora, Mike Henry, a repórteres, nesta terça-feira, em paralelo a uma conferência em Perth, Austrália. A Rio Tinto preferiu não comentar.
O acordo provavelmente tornaria mais complexo para a BHP ou para a Rio mirar qualquer aquisição futura da Fortescue, segundo Wayne Gordon, diretor-executivo para commodities e câmbio da UBS Wealth Management, por telefone, de Cingapura.
A cooperação entre as duas produtoras visa a desenvolver “novas plataformas para um futuro desenvolvimento de mina e a oferecer um novo produto alternativo de classe mundial à indústria siderúrgica chinesa”, disse Peter Poppinga, diretor-executivo de ferrosos da Vale, em comunicado. “Estamos olhando mais de 10 anos à frente”.
Embora estejam mirando as usinas da China, é provável que a Vale e a Fortescue também estejam se posicionando para competir em outros mercados, segundo Araújo, da SRK. “Um minério de qualidade média como esse pode ir para o Japão, para a Coreia do Sul”, disse ele.
“Eles poderiam até mesmo considerar o mercado da Índia, dependendo de como o setor de minério de ferro se desenvolver por lá”.
Fonte: Revista Exame