O setor de mineração costuma colecionar passivos ambientais. No final do ciclo, quando a área explorada é regenerada, a solução dificilmente foge da implantação de lagos ou do plantio de eucalipto e grama. Para dar modernidade à prática, pesquisadores do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) estruturam um projeto inédito que procura aliar técnicas de bioengenharia de solo ao conceito de serviços ambientais. O foco é restabelecer a biodiversidade perdida.
Por trás da iniciativa estão a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e a Vale, que fizeram um acordo de cooperação de até R$ 40 milhões para pesquisas nas áreas de mineração, energia, ecoeficiência, biodiversidade e produtos ferrosos para a siderurgia. O projeto dos pesquisadores do IPT, com duração prevista de 48 meses e investimentos de R$ 800 mil (50% do IPT e o restante dividido entre Fapesp e Vale) se insere neste guarda-chuva e, além do desenvolvimento de uma metodologia de recuperação de áreas degradadas, pode resultar em uma patente para o instituto.
Na mira estão áreas degradadas pela mineração de pedra, areia e calcário, insumos básicos da construção civil. Um estudo de 1997 do geólogo Omar Bitar indicava que havia cerca de 250 áreas degradadas e abandonadas por mineração na região metropolitana de São Paulo e outras 200 minas ativas à época, o que dá uma pista do potencial da iniciativa. “Nossa ideia é desenvolver um modelo para estabilização de solo e recomposição de áreas, com manutenção de serviços ambientais” diz a geóloga Amarilis Lucia Casteli Figueiredo Gallardo, pesquisadora do Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas (Cetae), do IPT, e coordenadora do estudo. “Queremos levar o gancho da sustentabilidade para o final do ciclo de exploração”, continua.
Apesar de regulamentada desde 1989, a recuperação das áreas mineradas ou não acontece ou ocorre de forma precária. “Nossa proposta é recuperá-las de maneira diferente, pensando em maximizar os serviços ambientais”, explica a pesquisadora Caroline Almeida Souza, da Seção de Sustentabilidade de Recursos Florestais do IPT.
Isso significa, por um lado, empregar técnicas de bioengenharia de solos, utilizadas normalmente na recuperação de rodovias ou em margens de rios, mas não na mineração, ilustra Amarilis Gallardo. Existem pelo menos 23 técnicas do gênero e que usam elementos da natureza em áreas a recuperar. Plantas inteiras, caules e ramos, tocos e pedras, por exemplo, são encravados no solo e dão reforço, servem como drenos hidráulicos ou barreiras que evitam movimentos do terreno. O uso de materiais artificiais é minimizado e a preferência é para recursos naturais que podem ser encontrados na região, evitando o transporte, a emissão de gases estufa e produzindo menor impacto.
A outra ponta é o foco nos serviços ambientais que podem ser obtidos com o restauro adequado da região. Espécies nativas serão prioridade na recomposição da biodiversidade. “Queremos agregar valor à atividade”, diz Amarilis Gallardo. No futuro, o maior comprometimento do setor com o ambiente pode ser uma entrada para sistemas de pagamento por serviços ambientais ou mercados de carbono. O trabalho começará com a escolha de duas áreas onde os modelos de recomposição serão testados. A ideia do grupo de seis pesquisadores é desenvolver indicadores ambientais e parâmetros de avaliação do desempenho, e, depois, criar um modelo que possa ser repetido em outros lugares do país.
“Não será uma panacéia para todos os problemas da mineração”, diz a engenheira florestal Caroline Souza, lembrando que, por outro lado, o setor tem muito potencial para se tornar mais sustentável. “O legado deste projeto será algo maior, estamos formando recursos humanos”, continua Caroline. O projeto inclui, além da equipe do IPT, o trabalho de nove bolsistas de mestrado e doutorado.
Fonte: Valor Econômico