Entrevista: Márcio Rezende

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Geógrafo e mestre em planejamento urbano, Márcio Rezende trabalha na Diretoria de Desenvolvimento e Economia Mineral (Didem/ DNPM), onde focaliza as atividades em ações de difusão tecnológica e extensionismo mineral. Ele fala da experiência com comunidades pobres do Pará e do trabalho realizado com cooperativismo e associativismo no DNPM.

RedeAPLmineral: Conte-nos um pouco da tua experiência profissional?

Márcio Rezende: Trabalhei por 14 anos como professor e, também, tenho experiência com a elaboração de Planos Diretores Participativos em municípios do Pará e também no município de São Jorge –GO.

RedeAPLmineral: Fale um pouco mais dos Planos Diretores?

Márcio Rezende: Os Planos Diretores Participativos são instrumentos para o desenvolvimento dos municípios brasileiros. Os Planos são chamados de participativos por quê eles contam com a participação da população local, que opina de forma contundente sobre o que ela quer implementar no local onde mora. 

RedeAPLmineral: Como a população participa da elaboração do Plano?

Márcio Rezende: Primeiro, há ações de sensibilização da população. Isto pode ser feito por meio de audiências públicas, encontros, palestras em escolas, associações, sindicatos, cooperativas, igrejas, prefeituras, Ministério Público e outros locais públicos. A comunidade aprende que ela tem que participar das discussões para ter mais ingerência sobre o desenvolvimento do local onde mora. 

RedeAPLmineral: Como encontrar um denominador comum diante de tantos interesses diferentes?   
                                                               
Márcio Rezende: 
É impossível juntar tantas pessoas com interesses particulares sem ter qualquer tipo de conflito. Mas as reuniões servem exatamente para dirimir essas tensões e tentar algum tipo de pacto entre todos os envolvidos. Claro que nessas situações há tensões, há controvérsias. Mas a vantagem é que o uso do espaço está muito mais próximo daquilo que o habitante pensa, diferentemente, da elaboração de Planos somente técnicos que não ouvem a voz da população local. É claro que esses planos são elaborados respeitando questões técnicas, políticas, ambientais, legais etc.

RedeAPLmineral: Você trabalha na Diretoria de Desenvolvimento e Economia Mineral (Didem/ DNPM), que tipo de trabalho vocês realizam?  

Márcio Rezende: A Didem é responsável pela difusão tecnológica e o extensionismo mineral. Ela promove a difusão do conhecimento geo-científico, tecnológico, econômico mineral, apartir da publicação de estudos e serviços. O objetivo da diretoria é de contribuir para a geração de emprego e renda e para o desenvolvimento regional integrado e sustentável. Quando agente trabalha com o cooperativismo, que se situa nas ações desta diretoria, agente quer fomentar a geração de emprego na mineração, em especial a pequena mineração. 

RedeAPLmineral: Como é que este apoio funciona?
   
Márcio Rezende:
 Primeiro, analisamos a questões técnicas. Procuramos mostrar a melhor técnica para os mineradores/garimpeiros extraírem sua produção de forma responsável e eficiente. Procuramos passar técnicas de organização da produção, gestão, administração, mercado, etc. Os produtores precisam confiar que estão recebendo informações técnicas de qualidade. E como isso podem alavancar a sua produção e renda e melhorar a sua qualidade de vida. Procuramos, também, estimular a adoção de tecnologias limpas, e ações que promovam ganhos na cadeia produtiva e agregação de valor ao produto mineral. 

RedeAPLmineral: Você pode um exemplo de ação?
   
Márcio Rezende:
 Vamos iniciar, agora no começo do ano, uma ação de extensionismo em Mata dos Palmitos no município de Ouro Preto-MG, em conjunto com o Cetem . O Cetem vai orientar os mineradores a usar uma máquina específica para ‘moldar’ a pedra sabão. A técnica é a úmido, que não solta pó. O DNPM vai aproveitar para sensibilizar os mineradores para a necessidade da legalização da atividade e para os pontos positivos deles formarem associações e cooperativas.  

RedeAPLmineral: Os trabalhos são sempre em conjunto com outras instituições?

Márcio Rezende: Depende de cada demanda. Por vezes somos demandados pelo Ministério Público, Ibama. Mas com as ações de extensionismo, normalmente, agente trabalha com entes que são fortes nas ações de cooperativismo e associativismo, como o Sebrae por exemplo. O que é importante ressaltar é que as nossas ações nunca podem ser realizadas sobre uma base de ilegalidade. O DNPM só desempenha suas atividades em áreas que são regularizadas, ou seja, que estão quites com suas obrigações legais, ambientais etc. Agora, se por acaso encontramos um situação em que a produção não está legalizada, primeiro fazemos uma trabalho de sensibilização para que todos se regularizem. Depois começarmos o trabalho de fomento.  Acredito que seja do interesse de todos que haja essa integração, que o poder público não seja apenas um agente de repressão, mas que ajude a sociedade a se desenvolver com responsabilidade e qualidade. 

RedeAPLmineral: Como um produtor/garimpeiro deve proceder diante da possibilidade de exploração de um mineral?  

Márcio Rezende: A primeira coisa a se fazer é verificar se a área a ser explorada está honerada, ou seja, saber se já há um direito minerário de uma pessoa ali. Em sendo honerada, é preciso estabelecer se a área está de acordo com a legislação: com taxas, impostos e prazos quites. Se a área não estiver em acordo com as determinações tem que se averiguar se a pessoa que tem o direito a exploração do mineral está interessada em explorar o local. Se ela não quiser explorar a área ela se manifesta contrariamente e a área, então, é colocada em disponibilidade para qualquer pessoa requerer a sua exploração. A exploração pode ser realizada tanto por cooperativas, empresas, quanto pessoas físicas. Apartir daí começa um processo de regularização da área. Dependendo do tipo de mineral que será explorado essa requisição é mais complexa ou simples.  

RedeAPLmineral: Então a pessoa pode ser dono ou não da terra que será explorada?

Márcio Rezende: Sim. Por quê ser o dono significa ser proprietário da superfície. E o subsolo é propriedade da União. Então é comum encontrar pessoas que são as donas da terra, porém não exploraram suas terras. Elas podem receber royalties ou outras formas de recompensa pecuniária. Normalmente as questões são acordadas entre as partes. Mas há casos de disputa judiciais pela exploração do subsolo. 

RedeAPLmineral: O governo federal finaliza um plano para o setor da construção civil. O que este plano deve abordar na tua opinião?

Márcio Rezende: O governo federal tem que planejar bem o programa, pactuar as ações com os órgãos competentes que têm atuação no setor da mineração como: MME, MCT, DNPM, Cetem, Ibram, etc. Como o segmento da construção civil depende, praticamente, do setor mineral (aço, brita, cerâmica, cimento, tinta, areia, revestimento, telhas, etc), aumentar a capacidade de exploração exige estudos para exploração e impacto ambiental, aumento de infra-estrutura etc. 

RedeAPLmineral: Qual sua participação na RedeAPLmineral?

Márcio Rezende: Eu sou suplente do Grupo de Trabalho Associativismo e Cooperativismo da RedeAPLmineral, há cerca de um ano. A Rede é uma grande iniciativa. Na minha opinião ela precisa de mais apoio, até governamental nesse estágio, por quê a Rede é muito jovem. E com esses tempos de crise financeiro e planos para fomentar o setor como todo, acho que é de suma importância que o governo preste atenção e apóie as ações da Rede para que ajude no desenvolvimento do País. 

RedeAPLmineral: Com sua experiência trabalhando com populações carentes, opine sobre as dificuldades em se trabalhar com eles em rede?

Márcio Rezende: Leva tempo para que a cultura da troca de informações e cooperação no âmbito do trabalho vingue. Muitas pessoas não compreendem o esforço que é necessário para mudar a mentalidade, a cultura das pessoas. Estamos trabalhando, muitas vezes, com pessoas quase iletradas, e esperamos que elas utilizem sofisticados instrumentos de informação e comunicação. A mudança é muito grande. Essa mudança leva tempo e acho que o atual governo tem que compreender esse tempo. 

RedeAPLmineral: O que pode ser feito para fomentar a Rede?

Márcio Rezende: Acredito que o Portal é a grande chave dessa mudança. Ele tem que ser um bom Portal. Tem que haver pessoas habilidosas trabalhando nele. Acredito que tem que haver uma profissionalização do corpo coordenativo da Rede e que tenha um grupo fixo, que tenha pessoas comprometidas com o seu desenvolvimento. Trabalhar com colaboradores é bastante difícil já que quase sempre eles têm outros afazeres e compromissos profissionais. 

RedeAPLmineral: Qual sua visão de sustentabilidade da Rede neste momento?

Márcio Rezende: A Rede depende do Estado. Há um interesse público muito forte por trás dele. Nesse momento só vejo a Rede sendo operada por iniciativa pública. 

RedeAPLmineral: E o que os usuários pode esperar do conteúdo da Rede?

Márcio Rezende: O conteúdo tem que estar em linguagem acessível para o seu público alvo principal que são os produtores minerais. Claro que tem que ter texto de alto nível, aliás, como tem hoje, mas ela tem que ter leituras compreensíveis para seu público alvo. Acredito que a linguagem deva ser mais didática para os usuários. 

RedeAPLmineral: Como facilitar o acesso dos usuários à Rede?

Márcio Rezende: Acredito que pelo processo de educação/inclusão digital dessas pessoas e, também, pela facilitação do acesso delas a computadores e a rede mundial de computadores, por exemplo através dos ‘Telecentros Minerais’. Talvez uma ação interessante fosse a de sensibilizar as pessoas com treinamentos, palestras, cursos etc, ‘in loco’. Chamar as pessoas para as suas associações, cooperativas, ou telecentro mais próximo, e divulgar que existe essa Rede e que ela está à disposição de todos. Articulações com entes governamentais, do terceiro setor e das empresas, que fazem parte da cadeia produtiva desses minerais, poderiam ajudar bastante também.

Por Claudio Almeida,

jornalista da RedeAPLmineral

Fonte: RedeAPLmineral

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