A mudança no cenário internacional a partir da crise econômica global de 2008 está levando as siderúrgicas brasileiras a ampliarem seus investimentos em mineração. Com planos de autossuficiência na matéria-prima até 2015, empresas como Usiminas, Gerdau e AcelorMittal estão expandindo suas minas no Brasil. Mesmo a CSN, que já é autossuficiente, está reforçando investimentos na área. Juntas, as quatro vão destinar mais de US$ 12 bilhões nos próximos cinco anos à expansão da atividade mineradora. Por trás dessa estratégia estão esforços para cortar custos e buscar novas fontes de receita. O resultado é uma curiosa disputa concorrencial com a Vale, tradicional fornecedora de minério de ferro no país.
Essa inversão de papéis na cadeia produtiva do aço começou como um movimento defensivo. Com a crise de 2008, tanto os preços do minério de ferro como os de produtos siderúrgicos caíram no ano seguinte e se recuperaram em seguida, mas os ritmos de queda e de alta foram bem diferentes. Enquanto o preço médio da tonelada de minério de ferro exportada pelo Brasil caiu 15% em 2009, o preço médio da tonelada de laminados (tipo de produto siderúrgico) exportada despencou 38%. Em 2010, a discrepância se repetiu. As exportações de minério atingiram recorde, com salto de 86,7% no preço médio da tonelada. O preço médio da tonelada de laminados avançou apenas 13,7%.
Mas o que explica patamares tão diferentes de reajustes de itens da mesma cadeia produtiva? No caso do minério, a resposta vem da China, que mantém seu apetite voraz pela matériaprima. No caso do aço, a retração das economias europeia e americana, após a crise de 2008, levou à redução no consumo de produtos siderúrgicos. O resultado foi uma sobreoferta que deve se manter até pelo menos 2012, diz a World Steel Association. Projeções da organização indicam capacidade ociosa para este ano de 532 milhões de toneladas de aço, ou 18 vezes o volume que o Brasil deve consumir em 2011.
— Além das mudanças internacionais, houve alterações estruturais no Brasil. Há até alguns anos, havia disputa de preços entre as mineradoras no país. Mas a Vale foi comprando uma a uma (casos de Samitri, Ferteco, MBR entre outras), reduzindo o poder de fogo das siderúrgicas — lembra o presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello.
CSN: minério já rende mais do que o aço
Como o minério — junto ao carvão — representa cerca de 50% do custo do aço, as siderúrgicas se viram contra a parede e buscaram fornecimento próprio. A Usiminas foi às compras em 2008 e arrematou uma mina em Serra Azul (MG). Em 2010, atraiu um parceiro internacional, a japonesa Sumitomo, e criou a Mineração Usiminas. Hoje, a capacidade de produção da empresa é de sete milhões de toneladas, ou 40% de sua necessidade. A meta para 2015, quando pretende chegar à autossuficiência, é de 29 milhões de toneladas, o que demandará US$ 4 bilhões.
O presidente da Usiminas,Wilson Brumer, ressalta, porém, que a autossuficiência será econômica. Por questões logísticas, parte da demanda continuará a ser suprida pela Vale. Ainda assim, a Mineração Usiminas deve “roubar” mercado de sua fornecedora, pois venderá o excedente.
— Pretendemos vender o minério a preços de mercado — diz Brumer.
Gerdau e ArcelorMittal estão no mesmo caminho. A primeira pretende atingir a autossuficiência em 2012, quando deverá produzir sete milhões de toneladas de minério de ferro. O insumo vai abastecer a unidade Aço Minas, única do grupo que consome minério — as demais usam sucata. A Gerdau não revela investimentos, mas informa que este ano 75% do minério que vai alimentar os altos-fornos da Aço Minas serão de produção própria. O grupo Arcelor, por sua vez, pretende chegar em 2015 com 75% de sua demanda global atendida por produção própria ou contratos estratégicos de fornecimento. Para isso, está investindo no Brasil US$ 75 milhões em projetos de mineração até 2012.
— Vejo a estratégia da Gerdau e da Arcelor como uma busca para redução de custos. As empresas que têm mais chances de tornar a mineração um negócio rentável são Usiminas e CSN — avalia Pedro Galdi, da corretora SLW.
Para a CSN, a rentabilidade dos negócios já aparece no balanço financeiro. No primeiro trimestre de 2011, o lucro bruto do segmento de mineração (R$ 774 milhões) superou o da siderurgia (R$ 670 milhões). A empresa diz que seu principal negócio continua a ser o aço, mas prepara investimentos robustos para ampliar a atividade mineradora: serão R$ 13 bilhões (cerca de US$ 8 bilhões) entre 2011 e 2015, para elevar a produção de 26 milhões de toneladas de minério de ferro para 89 milhões de toneladas. O salto tornará o duelo com a Vale inevitável. Hoje, 75% das vendas totais de minério da CSN são para terceiros.
Para acelerar os investimentos, a empresa pretende abrir o capital de da mina Casa de Pedra (MG) e da Namisa, empresa criada em 2007 e que reúne os demais ativos de mineração do grupo. “Essa abertura (de capital) seria importante para capturar o bom momento da mineração”, diz a siderúrgica. Procurada, a Vale não comentou o movimento das siderúrgicas.
Fonte: O Globo