A riqueza mineral escondida sob águas brasileiras vem despertando interesse de empresas de diferentes setores, da mineração à construção civil, dispostas a encontrar no fundo do mar “tesouros” que sustentem seus negócios no longo prazo. Nos últimos dois anos, o número de pedidos de pesquisa mineral no oceano deu um salto no país. Entre o início de 2009 e setembro de 2010, foram 637, segundo o Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM), órgão que outorga as solicitações. No biênio 2007-2008, apenas 56.
As buscas se estendem ao longo de toda a plataforma continental jurídica brasileira, uma área de 4,5 milhões de quilômetros quadrados chamada por estudiosos de Amazônia Azul, devido à sua biodiversidade. E o alvo dos pedidos é vasto. Vai de diamante e matérias-primas para fertilizantes – como sais de potássio e fosfato – a areia e cascalho, para uso em obras ou reposição de praias.
A Vale é uma das que estão apostando nessa nova fronteira exploratória. Ano passado, ela obteve autorização para pesquisar fosfato no litoral do Rio Grande do Norte. Procurada pelo GLOBO, preferiu não comentar as razões que a motivaram a fazer os pedidos. Hoje, a empresa tem exploração ou produção de fosfato e potássio no Brasil apenas em terra, nos estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Sergipe. O país é deficitário no setor de fertilizantes, importando mais de US$3 bilhões por ano para a agricultura nacional.
Carbonato de cálcio no litoral do Espírito Santo
Outra empresa que se empenha em vasculhar terras submarinas é a TWB, com sede no Guarujá (SP). O grupo iniciou as pesquisas em 2007, no intuito de encontrar fosfato no litoral do Espírito Santo, mas acabou topando com carbonato de cálcio, usado para corrigir a acidez do solo em plantações. Os estudos estão em fase avançada. De acordo com o vice-presidente da TWB, Walter Boschini, a empresa procura clientes de grande porte para viabilizar a atividade economicamente e pedir o aval do DNPM para a lavra:
– Essa substância não substitui os fertilizantes, mas potencializa suas ações. Já fizemos estudos com plantações de cana e obtivemos ganhos de produtividade. Também temos experimentos com manga e uva.
A pesquisa da TWB está sendo feita a 300 milhas da costa, o que torna a exploração do carbonato um desafio tecnológico. Boschini lembra, no entanto, que a empresa nasceu no ramo de construção e transporte naval, o que facilitará o desenvolvimento da logística necessária à exploração em alto-mar.
– Nossa grande motivação para a pesquisa foi justamente a busca de soluções tecnológicas.
A demanda pela pesquisa mineral marinha tem sido tão grande que o DNPM já avalia baixar normas específicas. Hoje, a pesquisa mineral em terra tem prazo de três anos, sem limite para renovação, mas há limitações de tamanho de área por pedido. No caso da areia, por exemplo, é de 50 hectares. O problema é que, na imensidão do mar, isso é quase nada. A ideia do DNPM é que esse limite seja ampliado para dez mil hectares no oceano. Um grupo de trabalho já estuda a questão, paralelamente às discussões do novo marco regulatório do setor mineral.
– A possibilidade de encontrar bens minerais na plataforma continental é uma nova realidade que se revela pelo potencial geológico dessa nova fronteira mineral, que no futuro será nossa Amazônia Azul – diz Miguel Nery, diretor geral do DNPM.
Construção civil também faz “caça ao tesouro”
Empresas do setor de construção civil também têm se aventurado na “caça ao tesouro”. Odebrecht e Votorantim Cimentos fizeram requerimentos para exploração de areia no litoral do Rio e do Ceará, respectivamente. A Odebrecht pretende usar a areia para reposição na praia de Sepetiba e disse que o pedido junto ao DNPM também faz parte do processo de autorização para obras de dragagem. A Votorantim não retornou as ligações.
A LLX, empresa de logística do grupo controlado por Eike Batista, também solicitou permissão para explorar ilmenita (tipo de minério usado em pinturas e construção) nas águas que beiram o município de São João da Barra, no Norte Fluminense. Segundo a empresa, o objetivo é usá-la nas obras do Porto do Açu, caso necessário. A companhia frisa, no entanto, que até agora não iniciou a exploração.
Os desafios tecnológicos, o elevado custo e as dúvidas quanto a seu impacto ambiental fazem com que o Brasil ainda engatinhe nessa atividade. Apesar do salto nas solicitações de pesquisa, o DNPM só deu uma única autorização de lavra, para a empresa Fertimar Mineração, que explora calcário no litoral do Espírito Santo.
Em outros países, a nova fronteira exploratória está mais desenvolvida, como na França, onde o calcário marinho é bastante consumido. E Papua-Nova Guiné, no Pacífico, está prestes a autorizar a exploração de jazidas de ouro e cobre a 1.600 metros de profundidade pela canadense Nautilus. A China também pediu em junho à Autoridade Internacional para os Fundos Marinhos (AIFM), da ONU, permissão para explorar uma área no Sudoeste do Oceano Índico e a Espanha busca manganês no Golfo de Cádiz.
Fonte: O Globo